Uma reflexão poderosa sobre a decadência interior e os perigos do amor esfriado.
No início, tudo parecia promissor. Judas despertava no Paraíso da convivência com Nosso Senhor, envolto pela beleza da fé nascente, acolhido com carinho.
Via nos olhos do Redentor e de seus pais espirituais o sorriso de quem lhe dizia: “Fica conosco…”. E ele ficou. E amou.
Mas com o passar do tempo, o encanto começou a esmorecer. Aquilo que era novidade tornou-se rotina. Aquilo que o enchia de fervor passou a parecer insípido.
O coração de Judas, antes tocado pela graça, começou a se distrair com lembranças de Carion: os trigais, as brincadeiras no riacho, as moedas do avô, os pequenos pecados escondidos e saborosos. A liberdade de fazer o que bem entendia…
Quando a alma se entedia da virtude
É assim que muitos começam a cair. Não porque foram agredidos por grandes tentações, mas porque permitiram que o gosto pela virtude esfriasse. O que antes era um deleite tornou-se “normal demais”.
Judas se sentia preso por regras. Sentia falta da “liberdade” de Carion. Lembrava com prazer os pecados da infância, o prazer do ilícito, da contenda, do imprevisível. O bem deixou de o encantar, e o mal começou a parecer saboroso.
A alma que esquece a grandeza do olhar de Jesus
Nesse processo de decadência, Judas foi perdendo o impacto que o olhar de Nosso Senhor causava nele. O olhar do Redentor, que penetra mais fundo que o sol, deixou de tocá-lo. Tornou-se algo a que ele “se acostumou”. Isso é o mais terrível: quando a alma já não se comove mais nem diante da santidade.
Nosso Senhor, em Sua misericórdia, permitiu que Judas fosse a Carion. Sabia que ele cairia, mas sabia também que impedir isso causaria uma revolta ainda maior. E Judas foi. E caiu. E ali começou a cavar o poço sem fundo onde se lançaria.
Da saudade do pecado à organização do pecado
Não demorou para que Judas, insatisfeito com a vida espiritual, começasse a organizar sua traição. Quis cuidar das esmolas… não para servir, mas para roubar. E mesmo vendo Nosso Senhor todos os dias, dizia consigo: “Ele não tem remorsos, eu tenho. Logo, Ele é que está errado, e eu, o coitado”.
E assim, num processo de racionalização diabólica, decidiu trair. Quando Maria Madalena unge os pés de Jesus com perfume caríssimo, Judas se revolta não pela pobreza dos outros, mas pelo dinheiro que não conseguiu roubar.
Trinta moedas. Um suspiro de perdição.
A cena do pacto é trágica: alguém o intercepta nas ruas de Jerusalém, oferecendo-lhe trinta moedas de ouro. Ele treme. O número o perturba, mas o desejo é mais forte. Não quer gastar, quer guardar. Quer ter. Idolatra o dinheiro. E aceita.
“Você não é traidor”, sussurra o tentador. “Ele vai morrer de qualquer jeito. Melhor você receber algo com isso.” E Judas responde: “Está selado”.
A Ceia, a cortesia, o ósculo: a última chance de voltar
Na Santa Ceia, ele já está endurecido. Nosso Senhor tenta tocá-lo. Molha o pão e o oferece com ternura. Judas come. Não se comove. Seu coração já pertence a Carion, às moedas, ao próprio ego.
E Jesus diz: “O que tens de fazer, faze-o logo”.
Ele sai. E o Evangelho registra: “Era noite”. Era noite na cidade, noite em sua alma, noite na história.
O desfecho de quem não se arrepende
Depois da traição, vem o remorso. Mas Judas não recorre a Nossa Senhora, que certamente rezava por ele. Ele rejeita a graça, e se enforca. Seu corpo apodrece, e sua memória se torna maldita.
A advertência para nós: esfriar é o primeiro passo para cair
Nem toda traição começa com um ato. Muitas começam com uma nostalgia. A saudade do pecado. A lembrança romântica do mundo. A alma que esquece as consolações da primeira comunhão, do retiro, da confissão sincera, começa a vacilar. Esquece o quanto valia um olhar de Jesus. E se torna cega.
Sejamos fiéis na aridez
Na hora em que tudo parece seco, sem graça, sem brilho… é aí que o amor se prova. Quem for fiel nessas horas, receberá graças inimagináveis. E será sustentado por Nossa Senhora na hora da consolação.
Uma resposta
Santo Padre Pio rogai por nós